O texto a seguir possui spoilers do livro A Tormenta de Espadas que ainda não foram abordados na série de TV. Leia por sua conta. Este episódio adaptou pedacinhos (realmente pequenos) dos capítulos Sam III, Jon IV, Catelyn V e Jaime V, sendo de longe o episódio mais autoral, transitório, e menos literal ao conteúdo do livro da série até agora.  Para ver o conteúdo geral destes capítulos, clique aqui.

The Climb, episódio que contemplou o tema da escalada literal e filosófica, tivemos a oportunidade de ver a tão esperada cena em que Jon e Ygritte escalam a Muralha de Gelo enquanto a Muralha tenta se defender. Em contraponto, vemos Mindinho em seu momento mais assustador e niilista em toda a série até então. Como disse a crítica de TV do io9, o episódio é sobre darwinismo social. Essa é a primeira vez que Game of Thrones mostrou o quanto o poder que os produtores possuem em cima da obra original é importante para a adaptação e para a obra de maneira geral. Ou alguém aqui esperava por aqueles ‘spoilers’ na cena com Melisandre?

Este foi o episódio menos bem avaliado pelos espectadores (leitores ou não). Temos por trás dele a direção de Alik Sakharov, diretor e cinematógrafo que sempre fica com algumas cenas bem simbólicas em Game of Thrones. Foi ele quem dirigiu o “What is Dead May never Die” ano passado, aquele episódio em que Theon é batizado e o episódio termina com o garoto Lommy morto pelos homens Lannister. Assim como vemos Ros morta, da maneira mais macabra de todas, neste aqui também.

No início temos Sam, Gilly e o bebê, sozinhos se aquecendo em um dos lugares mais frios e perigosos do mundo. Ignorando o fato e que Sam está se aproveitando do único tempo que tem para tentar ser alguém para uma moça (sendo que ele não pode), essa foi uma cena doce, cheia de canção e religião. Como se estivéssemos respirando bem fundo para enfrentar uma nuvem negra de mau agouro e más notícias. É muito bonita a maneira como a série tem colocado as músicas dos livros nas cenas, não é? E olha só, Sam resolve mostrar para a amiga a adaga de obsidiana que achou no Punho, mesmo que ele ainda não saiba muito bem ainda sua serventia. O uso da canção foi tirado de Samwell III no livro. Uma cena realmente muito bonita.
Parece besteira, mas mostrar que Osha e Meera precisam de muito tempo pra discutir a relação e se tornarem toleráveis uma à outra é uma ótima preocupação da série em relação aos diferentes tipos de pessoas e crenças dentro desse universo. Principalmente a dinâmica dos selvagens em relação as pessoas que se ajoelham. E aí a cena corta para algo maior do aquilo, que é Jojen tendo ataques durante suas visões. É um aspecto inexistente nos livros, e uma maneira de deixar as coisas menos místicas, menos CGI, menos gastos. Jon está rodeado de inimigos. Mas quem não está?


O tema do episódio busca mostrar as relações entre os nossos deveres em relação a uma crença ou grupo em contraponto com a nossa lealdade com algo ou alguém. Ygritte colocando isso na cabeça de Jon, reforça o motivo pelo qual a Patrulha da Noite exige voto de castidade. Simbolicamente vemos  o quanto isso é forte no momento em que Orell corta os dois para fora da corda. Eles precisam sobreviver sozinhos. Se posicionar o relacionamento deles como “somos nós contra eles” é algo valido para a personagem da Ygritte eu não sei, isso não está no texto original, e a personagem é bem menos desapegada a isso, e é por isso que a beleza dela é algo que tem a ver com a liberdade que ele não só sente em relação a Mance, como a Jon também. Ela é livre, e todos os selvagens são. Mas, talvez isso tenha sido colocado para fazer com que a memória da personagem mais pra frente seja mais pessoal para Jon. Como se o amor tenha acontecido pra ele de maneira integral com ela.

A questão do poder do dinheiro nos é colocada novamente, mostrando assim como no livro, como a Irmandade carrega essa ideologia heróica tão bonita, mas… no fundo a noite é escura e cheia de terrores. E é necessário aço, mantimentos, cavalos. Ouro. Portanto Gendry, eles vendem você. Portanto Arya, eles querem pedir o seu resgate.

Mas não só disso se trata esse enigmático encontro de Melisandre com Arya, Gendry, Thoros e Beric. Primeiro temos Melisandre horrorizada com o fato de que Beric foi trazido à vida através de R’hllor. E, pior ainda, quando chegou ao outro lado não havia nada, apenas escuridão.

Desde que ficou claro nos trailers que Melisandre se encontraria com Arya, tive essa sensação de que a sacerdotiza teria um papel parecido com o da Fantasma de Coração Alto nos livros. Apenas pra relembrar, as previsões mais expressivas dessa personagem nos livros acontecem no capítulo Arya VIII:

“O rei da lula gigante está morto e lorde Hoster também. O bode senta sozinho e febril no salão dos reis enquanto o grande Cão cai sobre ele; sonhou com um lobo uivando na chuva com ninguém para ouvi-lo, um clangor com tambores, berrantes, flautas e gritos e o som triste de pequenas campainhas. Sonhou com uma donzela em um banquete com serpente roxas nos cabelos e veneno pingando de suas presas. Sonhou também com a mesma donzela matando um gigante selvagem em um castelo feito de neve.” De repente ela avista Arya e a chama de “criança de sangue… é cruel ao vir ao meu monte. Empanturrei-me de pesar em Solarestival, não preciso do seu. Desapareça daqui, coração negro.”

No entanto é Melisandre quem aparece para Arya, para profetizar e assustar. Diz que vê morte nos olhos dela, olhos azuis, verdes a castanhos. E vê que elas se encontrarão novamente. Isso é algo novo, definitivamente. Ainda sobre Melisandre, é realmente intrigante que ela tenha presenciado o sombrio poder de trazer as pessoas da morte, algo que parece uma possibilidade pra ela depois de um dos acontecimentos mais fundamentais que ela presencia e até prevê em A Dança dos Dragões. Achei a cena valiosíssima, e uma espécie de deboche dos produtores, mostrando que eles sabem mais do que a gente, e que isso é ótimo.

Pra terminar esta parte, gostaria de dizer o quanto é bacana ver a Carice e o Paul falando em alto valiriano. Ainda mais ver a reação de Arya escutando “valar morghulis” e relacionando aquilo a seu tutor, Jaqen. E bem, neste episódio, Beric realmente se pareceu com um espantalho. Não foi a toa que Melisandre ficou horrorizada.


E nessa questão do garoto que tortura Theon, dá pra perceber que dentro desse personagem existe a questão do que ele precisa fazer capturando Theon em contraponto com o que ele quer fazer. O que ele precisa e o que ele quer fazer são coisas diferentes. Porque o abuso ali é claramente gratuito. Não há motivo para Theon ter seu dedo esfolado de maneira tão cruel e vagarosa a ponto de o personagem se ver gritando pedindo para que seu dedo seja arrancado, tamanha a dor. A diferença que causa estranheza aqui é o fato de que Theon não faz ideia de quem seja esse garoto, algo diferente dos livros, em diversos níveis. Se há alguém perturbado que gosta de esfolar pessoas, de quem estamos falando, Theon? É claro que não de um Karstark.

Eu não me lembro de ter visto uma cena tão violenta e torturante para o espectador dessa maneira. E isso apenas reforça o fato que que este “bastardo”, e apenas ele, é capaz de fazer isso. Uma mente tão doente e má, que no mínimo sonhou em ter um brinquedo como Theon durante muito tempo.

chapéus divertidos da família Frey

E nesse episódio tivemos as conversas definitivas sobre dois dos casamentos de A Tormenta de Espadas. Conhecemos Walder Negro e Lothar “Coxo” Frey, com seus chapéus esquisitos. Nos livros eles já estão em Correrrio na época no funeral de Hoster Tully. Há algo fundamental que acredito que faltou no texto da cena em que eles obrigam Edmure a aceitar o casamento com Roslin: o fato de que Edmure no livro coloca que Brynden não estaria na posição de obrigá-lo a se casar, uma vez que ele mesmo se recusou a fazer algo parecido no passado. Tirando isso, achei a perspectiva de que Edmure está pagando pelos pecados de Robb, e que isso não cheira bem, algo muito forte. Talvez a mensagem seja mais forte porque estamos olhando pra isso com olhos de quem já sabe que acontecerá. A gentileza de Robb perante aos Freys e a esperança do jovem rei em relação a essa aliança é algo tão puro… a boa vontade dele de tentar resolver isso da melhor maneira, em contraponto com a relação que os líderes em Porto Real lidam com as questões de casamento arranjado é bem interessante. No final, é tudo monstruoso, mas há em Robb a inocência de que “no final, tudo dará certo”. Essa cena é uma adaptação de Catelyn IV.

“As an authority on myself, I must disagree.”

E, enquanto isso, temos Olenna e Tywin em um duelo divertidíssimo de palavras, acusações e exibição de poder e nome. Uma das melhores cenas stand-out da temporada. Mas embora a mensagem seja bastante divertida, ela é moderna demais para um ambiente medieval. Olenna soltando pérolas como dizer que Loras é um “sword-swallowing through and through”, ou sugerindo que Tywin poderia ter se aventurado nos lençois dos primos e amigos quando mais novo, apenas para vê-lo ainda mais irritado com a sua maneira prática e livre de ver o mundo. Eu particularmente gosto muito da mensagem que a série tenta passar através dos Tyrell, pessoas a frente de seu tempo. Mas não acho que uma senhora com as ideias como as de Olenna seria respeitada nesse “contexto histórico”.

No livro Cersei é recusada pela família Tyrell, e então Tywin resolve achar outro pretendente pra ela. Estou muito curiosa pra saber onde a série levará isso. Gostei bastante da maneira como colocaram uma possibilidade para Loras entrar para a Guarda Real… ainda que essa ideia tenha começado a ser construída apenas agora.


Agora vamos falar da adaptação de Jaime V. A incapacidade de Jaime ao tentar se alimentar, Brienne vestida de maneira bizarra, a química entre os dois personagens, tudo nessa cena foi bem sucedido. Não há como não sentir que a família Bolton foi muito bem escalada na série. O Roose interpretado por Michael McElhatton é algo realmente incrível. Na semana passada falei sobre seus estranhos olhos gentis. Hoje gostaria de falar sobre sua voz cavernosa, algo que nem sequer parece natural, mas é. E isso é assustador. Fico pensando que tipo de homem se orgulha em ter um homem esfolado em seu estandarte. É algo que faz com que ele sinta orgulho de sua casa? Argh. Medo.

Nessa capítulo do livro, é citada a presença de Elmar Frey junto de Roose Bolton. Oh, well.
A cena de escalada foi uma sequência de ação extremamente bem editada e bem construída. Embora bem diferente do clima e dos elementos apresentados nos livros, que não possui nessa cena os personagens Tormund e Orell, por exemplo. O líder da escalada nos livros é o Magnar of Thenn e há profissionais liderando o processo. Algo diferente dos livros também  é o fato de que é meia noite quando Jon chega ao topo. Além disso, Ygritte no livro odeia a Muralha e chora quando chega ao topo, falando sobre o fato de que não acharam o berrante do Joramun para derrubá-la. Não há romance, não há sol.

Achei incrível a maneira como mostraram que a Muralha se defende. A escalada é uma adaptação de Jon IV e mostrou de maneira bastante genuína não só como o homems são pequenos perto na força daquela natureza, mas como a Muralha é algo impossível de se enfrentar. E isso diz muito sobre os selvagens, os únicos loucos o bastante de terem dentro do peito essa coragem, de enfrentar esse impossível. Algo que talvez a gente veja entre os nortenhos também, em suas ações e em suas crenças.

E ainda há a ideia de que Bran e Sam movem-se em direção a esta mesma muralha. Cada um deles em uma direção oposta. Isso é insano, não estamos falando de um montinho de neve.

Acho que como o orgulho de “Jardim de Cima”, Loras poderia saber se comportar melhor ao falar com as pessoas. A cena de Sansa e Loras conversando no jardim é doce, leve, engraçada e juvenil, mas eu gostaria muito que Loras levantasse a bandeira gay sem precisar se utilizar de tantos clichês. Mas esse foi um episódio de inúmeros clichês. E Loras sendo assim, por outro lado, abre-se uma imensa possibilidade de ele ser doutrinado por Jaime na Guarda Real, mais pra frente. O personagem pode crescer, e isso é algo bom.

A mulher mais bela dos Sete Reinos?

Há algo em Cersei que sabe que, no final das contas, tudo estará bem com ela. Talvez depois de passar por várias experiências de quase suicídio em Blackwater, e o pensamento em Jaime. Nesta cena por exemplo, ficamos sabendo que foi Joffrey quem encomendou o assassinato de Tyrion, embora nos livros isso nunca tenha sido de fato esclarecido.

Quando Tywin diz a Tyrion que o anão é uma criaturinha desagradável, invejosa e rancorosa naquela conversa do episodio 3.01, ele estava falando da essência do que Tyrion passa ao pai e a todos a sua volta nos livros. Na série, Tyrion é um homem muito mais doce, passivo. Ele aparece em tela apenas para perguntar gentilmente a todos quem tentou matá-lo em Blackwater… talvez ele poderia estar mais envolvido com os outros personagens. Mas bem, ele definitivamente terá Sansa e a dinâmica dos dois pode ser algo surpreendente.
A abstração de Varys ao se colocar como protetor do reino e do trono, ainda é algo muito irrisório para a série que conta as passagens desse personagem de maneira tão rápida e com muito alegorismo. E para os leitores, chegar a conclusão de que Mindinho causa o caos deliberadamente para atingir seus objetivos é deliciosa. A série vem nos entregando isso de bandeja, no entanto. O discurso sobre o caos, algo que vimos na primeira promo da 3ª temporada há meses é algo realmente bem escrito e feito pra trazer este como o tema do episódio. Mas gente… ser surpreendido não é muito mais legal? Como o editor do Westeros disse, Mindinho é quase um vilão com bigode do 007 aqui.

Mas acho que a cena de Sansa chorando ao ver o navio de Mindinho partindo foi tão genuína, mas tão genuína do ponto de vista dessa personagem (em relação a todas as cenas de Porto Real desse episódio) que fica uma sensação muito legal de que Sansa precisa de vingança e logo. E de que, se existe alguém que pode derrubar Mindinho do topo de sua escada, essa pessoa é ela. Mesmo que ela nem saiba disso ainda. Mesmo que ela não saiba que talvez seja ele o culpado por todos os seus problemas. Inclusive os que ainda estão por vir.

Adeus, Ros.
Na tarde de domingo, como infelizmente tem sido tradição, vazaram alguns screencaps do episódio. Era justamente a cena de Ros pendurada no dossel, perfurada pela besta de Joffrey. Compartilhamos as imagens entre nós aqui da equipe do site e todos ficamos absurdamente devastados. Por ser Ros, personagem que nunca nos foi controversa como muitos dizem. Por ser daquela maneira. E por ser Joffrey e Mindinho. Assim como o espantalho de Arya no início do episódio, Ros tem flechas em seu rosto, virilha e seios. Enquanto a câmera se aproxima, vemos o quanto seu corpo está quebrado e sem vida. É um horror infinito, que traduz muito do que Game of Thrones se trata. A gente as vezes estranha a maneira como Joffrey é retratado na série, mas nos esquecemos de lembrar de alguns elementos dos livros que são inacreditavelmente violentos. Como Ramsay que deixa sua esposa comer os próprios dedos de tanta fome. Ou o que sabemos que Victartion Greyjoy fez com a própria mulher. Ou o que Tywin fez com a prostituta de seu pai, ou com a ex-mulher de Tyrion. Ou ainda todas as vezes que Sansa é espancada ou humilhada pelo rei. Esses elementos de violência contra as mulheres estão presentes nos livros de maneira muito mais significativa. E acho que essa é a primeira vez que a série é tão honesta sobre isso. Ainda mais tratando-se de Ros, uma atriz tão inspirada, uma personagem tão polêmica à alguns. Sabe o que é mais terrível? Não foi dado a essa personagem a possibilidade de morrer apropriadamente. A cena é mais importante do que o valor de Ros. Entendem o que quero dizer? A morte não foi sobre ela, foi sobre outras pessoas. Foi sobre Mindinho e Joffrey. Ela estava completamente sexualizada na cena, enquanto Joffrey vestia roupas. E mesmo assim, a cena foi sobre ele. Acho sinceramente que Ros merecia mais.

E depois de tanto lutar para subir, chega o descanso e o ar puro e fresco nos pulmões. Quando suas cordas foram cortadas, nenhum rei, lorde, comandante ou irmão poderia salvá-los. Mas um salvou ao outro. O que é quase (mas sabemos que não) um sopro de alívio através do discurso de Mindinho, que promove a escalada social através do caos. Porque o que Ygritte e Jon encontram, além de um do outro, é o mundo verde, vivo e quente esperando por eles.

Eu acho que escalar por seus sonhos, seus objetivos e suas crenças acaba sendo uma atividade bastante solitária, algo que Ygritte coloca bastante aqui. E é por isso que talvez este seja um episódio que pareça tão descolado. Só acho que, parafraseando aquele garoto sem nome, se você acha que este foi um episódio que não merece atenção, você não tem prestado muita atenção.

[x] Em todas as minhas resenhas sempre garimpo imagens e gifs do Tumblr pra ilustrar o texto. Aqui você encontrou imagens retiradas de sites como o wicnet, fuckyeahwinterfell capsofthrones. O trabalho desses tumblrs na criação e tratamento dessas imagens é muito bacana, bem feito, completo e especial. Não deixe de acompanhá-los.